“O presente trabalho tem por objetivo analisar o processo de figuração da personagem do diabo no conto “Aventura incompreensível atestada por toda uma província”, do Marquês de Sade. Tal processo guarda características que o distingue das demais personagens cuja figuração aponta para o protocolo realista, e tem por efeito o medo. Esse efeito é assegurado pelo modo como a personagem é construída, com a presença de diversos índices que sugerem sua existência ambígua e seu caráter maligno. A descrição provoca incerteza quanto a sua natureza e seu poder de malignidade, o que suscita o medo no leitor. O viés moralizante da obra vai de encontro à proposta estética do próprio Sade no prefácio à antologia Os Crimes do Amor, intitulado “Nota sobre romances ou a arte de escrever ao gosto do público”, em que discorre sobre as representações do vício e da virtude, de acordo com a natureza humana. Por fim, considera-se o efeito de medo artístico, conforme classificação de Júlio França, gerado por tais personagens: o barão castigado e o diabo punitivo. O leitor, por um lado, é capaz de fruir a narrativa sem correr riscos reais e, por outro, teme por suas próprias escolhas, se o insólito for tomado como referência possível para compreender o mundo racional. O próprio título já revela certa ambiguidade, pois a situação, apesar de incompreensível, foi confirmada por toda a província, evidência que o narrador enfatiza logo no começo do conto.”
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(*) Esse ensaio foi publicado originalmente nos anais do III Congresso Internacional Vertentes do Insólito Ficcional (SEPEL 2016). Republicamos aqui, com autorização do própriao autor, com fins puramente acadêmicos.